Eles estavam deitados, pós-gozo,
olhando as linhas paralelas do forro do teto, meio entediados, meio com sono.
Ela tinha a cabeça apoiada sobre o peito do cara e sua mão direita repousava
sobre o mamilo esquerdo dele. Ele acariciava algumas mexas do cabelo da garota
e brincava de fazer pequenos cachos os enrolando com o indicador. Estavam
sérios. O ventilador se virava, de um lado a outro, bambo, sem dar conta de
movimentar o ar o suficiente para romper a camada densa que se instalara no
cômodo. O som das palhetas rodando era o único que contrabalanceava o peso do
silêncio. Não havia barulho de trânsito fora, nem ruído doméstico dentro. Aconteceu
o seguinte:
Ele: _ Melhor a gente não se ver
mais.
Ela: _ Concordo.
Ele: _ Não tô a fim de me
apaixonar por ti.
Ela: _ Oi!?
Ele: _ Eu disse que não tô a fim
de me apaixonar por ti.
Ela: _ Que papinho de adolescente
pau no cu é esse?
Ele: _ É sério.
Ela: _ Não tem como levar a sério
isso. Desculpa.
Ele: _ Tu não acredita que eu
possa me apaixonar por ti?
Ela: _ Acreditar, acredito. Mas a
gente se apaixona, se desapaixona, é feliz, se fode, eticétera.
Ele: _ Então tu acha que eu devo
me apaixonar por ti?
Ela: _ Só se tu quiser te foder.
Ele: _ Por quê?
Ela: _ Porque eu não tô a fim de
me apaixonar por ti.
Ele: _ Que papinho de adolescente
pau no cu é esse?
Ela: _ Tu não tá entendendo. Eu
não vou me apaixonar por ti, nem tô a fim de forçar a barra pra isso acontecer,
se é que isso é possível...
Ele: _ Como tu sabe que não vai te
apaixonar por mim?
Ela: _ Querido, confie em mim.
Não vai rolar, não rolou.
Ele: _ Foi porque eu disse que
tenho medo de me apaixonar por ti?
Ela: _ Também... Mas,
principalmente, porque te achei chato.
Ele: _ Chato!? Como assim!?
Ela: _ Não tô dizendo que tu é
chato. Disse que eu te achei chato. É só meu ponto de vista, tu não precisa dar
tanta importância pra ele.
Ele: _ Agora eu quero saber
porque tu me acha chato!
Ela: _ Tá vendo? Por isso tu é
chato. Quer que eu te explique tudo.
Ele: _ Tu não acha que tu tá
sendo um pouquinho escrota? Tenho o direito de saber por que tu me acha chato!
Ela: _ Tô sendo escrota, sim, mas
é pra evitar que tu te apaixone por mim e tal. Tô te prestando um favor, nem
precisa agradecer. E tu não tem direito a nada, antes que eu me esqueça. Eu
falo se eu quiser, o que eu quiser e não quero falar... Agora acho que tu
precisa ir embora.
Ele: _ Não, por favor... Deixa eu
ficar só mais um pouco...
Ela: _ Cara, eu não gostei de ti!
Tu é masoquista ou alguma coisa assim? Não curto essas paradas, não. Por favor,
melhor tu ir.
Ele: (...)
Ela: _ Tchau. Obrigada pela foda.
Aquele havia sido o segundo
encontro deles. A iniciativa de trepar, obviamente, havia partido dela, que
sugeriu assistirem um filme em sua casa com terceiras, quartas e quintas
intenções. Nunca mais se viram depois daquela noite. Ela não atendeu as ligações
dele e o bloqueou no WhatsApp. Ele passou quatro meses stalkeando o perfil dela
no Facebook, mesmo depois de também ter levado block lá. Criou uma conta fake
apenas para continuar acompanhando as postagens e ficar admirando as fotos da
moça. Os amigos dele precisaram aguentar semanas de lamentações e desabafos
dramáticos seguidos de porres babacas dignos de pena. Ele estava convencido de
que havia perdida a mãe de seus filhos e que nunca encontraria alguém à altura.
Ele só superou a crise quando, atendendo aos
apelos de um conhecido em comum, a moça foi procurá-lo, cheia de dó. Ela sabia
o que fazer. Disse a ele que só o tratou mal porque, realmente, também estava
com medo de se apaixonar. Confessou que não queria se sentir tão vulnerável. Pediu
perdão pelo ocorrido. Era tudo mentira, mas o cara acreditou. Então, como ela
previa, ele se encheu de orgulho e disse que já era tarde demais, que não valia
mais a pena arriscar. Ela fingiu que lamentou, insistiu um pouco, mas o moço
estava irredutível. Não se falaram mais. Ele parou de stalkeá-la, se interessou
por outras mulheres. Depois, se vangloriou do que fez para os amigos que, por
pacto, jamais lhe revelaram a verdade. Entre os amigos dela, ele virou uma
piada pronta. E tudo acabou bem.