A inspiração é imatura e irresponsável. Afetação adolescente achar que os mecanismos racionais que
te permitem criar não podem, voluntariamente, ser acionados. Ingenuidade
esperar por um evento externo, aleatório, pra fazer algo que tu poderias fazer
se realmente te dedicasse a fazê-lo. Escrever por impulso produz ideias piegas,
superficiais, dramáticas, frágeis. Um bom trabalho requer esforço, avaliação,
critério, tempo. Não há espaço pra autocrítica se tu vomitar palavras sem
pensar em conexões lógicas e estruturas razoavelmente elaboradas. Bobagem usar escassez criativa como desculpa pra
tua inabilidade de te concentrar o suficiente pra fazer o que precisa. Tudo que
tu necessitas pra fazer o que tu é capaz de fazer existe independente de
casualidades. Gatilhos e insights são atalhos que tua cabeça inventou por
preguiça de percorrer caminhos retos e objetivos. Fatos, sensações, sentimentos
e falas não precisam necessariamente preexistir pra serem criados. A ficção
não demanda veracidade, só consistência. A liberdade tá na concretude da
criação, não na ressignificação da vida. As palavras não precisam ser ditas
pra serem escritas. A vida não é um filme esperando pra ser gravado. Tu não é
um personagem. Ninguém é um personagem. Não existem enredos prontos. Tudo
requer método, métrica, sentido, cuidado pra ser elaborado e não soar dramático. Não há histórias
pré-moldadas. Não há mágica, nem milagre. E o fato de tu ter escrito essa merda,
em menos de dez minutos, depois de olhar pra ela, não quer dizer absolutamente
nada.
segunda-feira, 26 de agosto de 2013
domingo, 18 de agosto de 2013
Das coisas que eu pensei ter desaprendido como faz (ou nunca soube fazer)
Não há palavras. Não há verbos.
Adjetivos. Substantivos. Pronomes. Não há artigos. Não há pensamento. Há o
estar e o existir. Há ela. Há ela estando e existindo. Há seu rosto na
contraluz e sua respiração tranquila. Não há mais eu. Há ela embrulhada no cobertor
com a cabeça afundando o travesseiro. Há o quarto escuro. Não há mais nada lá fora. Não há sentido ou incompreensão. Não há
pensamentos, suposições, teorias, divagações, lógicas, preocupações, anseios,
trabalho, televisão, frustrações, complexos, pobreza, fome, injustiça, violência,
hipocrisia, pessoas, mundo. Há seus traços delicados e sua pele pálida. Há sua
inconsciência abraçando o tempo/espaço. Há o peito quieto e a cabeça vazia. Há
um nirvana, tímido, silencioso. Há o presente se espreguiçando tranquilo pela madrugada. E ela dentro nele. Não há mais nada.
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