Há a falta e, com a falta, o excesso. Me sobram excessos, feridas abertas, carnes rasgadas. O drama não se justifica, não é autoexplicativo, não é embasado por nada trágico. Mesmo assim, queria me prostrar no chão que pisas, beijar teus pés, pra, mais uma vez, pedir perdão e confessar que tô com saudade. Porque meu chão é movediço, arenoso, frágil. Me equilibro pra não cair, não tropeçar em minhas próprias pernas, não desapontar mais ninguém. Vacilo agora por incompetência e angustia. Não vou esquecer que, um dia, eu enrolei minhas pernas nas tuas pra dormir tranquilo. Eu quis acreditar em mim, mas eu sou fraco, mesquinho e autodestrutivo. Não sou nobre ou digno. A culpa me persegue por ter oferecido tão pouco em troca de tanto. Aqui, só há teu rosto na tela fria e a vontade de construir uma máquina do tempo com pedaços de alumínio reciclado e um relógio de criança. Mas viagens ao passado são ilusões e eu não posso mais me perder no presente. Não há como fugir da dor. Não há nada a fazer e, de certa forma, não ligo porque ainda não descobri, exatamente, o que deveria fazer. Eu só sinto muito, muita coisa. Aprendo aos poucos, devagar, a andar e a crescer.
terça-feira, 24 de dezembro de 2013
Há a falta e, com a falta, o excesso. Me sobram excessos, feridas abertas, carnes rasgadas. O drama não se justifica, não é autoexplicativo, não é embasado por nada trágico. Mesmo assim, queria me prostrar no chão que pisas, beijar teus pés, pra, mais uma vez, pedir perdão e confessar que tô com saudade. Porque meu chão é movediço, arenoso, frágil. Me equilibro pra não cair, não tropeçar em minhas próprias pernas, não desapontar mais ninguém. Vacilo agora por incompetência e angustia. Não vou esquecer que, um dia, eu enrolei minhas pernas nas tuas pra dormir tranquilo. Eu quis acreditar em mim, mas eu sou fraco, mesquinho e autodestrutivo. Não sou nobre ou digno. A culpa me persegue por ter oferecido tão pouco em troca de tanto. Aqui, só há teu rosto na tela fria e a vontade de construir uma máquina do tempo com pedaços de alumínio reciclado e um relógio de criança. Mas viagens ao passado são ilusões e eu não posso mais me perder no presente. Não há como fugir da dor. Não há nada a fazer e, de certa forma, não ligo porque ainda não descobri, exatamente, o que deveria fazer. Eu só sinto muito, muita coisa. Aprendo aos poucos, devagar, a andar e a crescer.
domingo, 22 de dezembro de 2013
Pão e Circo.
Com minha
cabeça na guilhotina, eu rio do carrasco. Trêmulo, ele segura a corda que ativará
as engrenagens da máquina. Finge ressentimento e culpa antecipada pelo que
fará. Só o carrasco sabe das minhas intenções. O público aguarda impaciente a decapitação,
famintos pela desgraça. Ansiosos, os corações, mesmo com a certeza do que
sucederá, batem acelerados, nervosos. Mesmo prevendo o óbvio, a ideia de um
homem perdendo a cabeça lhes embrulha o estômago, apaziguando sua fome. Mas eu
também rio da cara do público, carente de diversão, amenizando suas tristezas
com espetáculos fúnebres. Não tenho medo do que as pessoas farão. Eu sinto pena
por elas precisarem me ver morrer pra sorrir. No entanto, o público sabe que
não morrerei aqui, preso e humilhado. É a ideia da morte que os fascina. Surpreendentemente,
no auge da expectativa, zunindo, a lâmina corta o ar e atinge certeira meu
pescoço. Sangro pouco. Aprendi a não me machucar. Minha cabeça rola pelo chão
enquanto o carrasco tira meu corpo da máquina.
O público
murmurando palavras, impressionado e com medo, admira meu crânio sorridente
virado pra o céu. Consigo ouvir frases soltas: “Que horrível”; “Fecha o olho”;
“Deus tenha piedade”. Coisas assim. Como essa é a parte mais cansativa do meu
show, levanto imediatamente meu corpo jogado na coxia e vou correndo buscar a
cabeça. Há um grande assombro, algumas pessoas vomitam, outras desmaiam, uns
poucos se cagam de medo. Eles não sabem que, certa vez, perdi a cabeça e
precisei colá-la com Super Bonder. Desde então, ainda que pareça que a perdi,
aprendi a olhá-la para além de mim. As luzes começam a piscar no alto do
picadeiro e meus olhos doem. Pego a cabeça entre as mãos e, como se eu fosse um
boneco de Lego, religo o crânio com a coluna com um só movimento. Não há mais
sangue ou vísceras, tudo está intacto e inteiro. Faço uma reverência e,
inebriada, a plateia amortecida aplaude de pé sem desconfiar de como fiz o que
fiz. Amanhã tem mais.
sábado, 7 de dezembro de 2013
Unicórnios saltitantes.
Um bom texto começa pelo título. Ele precisa ser arrojado e esbanjar sobriedade. Afinal, as palavras, quando escritas e divulgadas, tornam-se um registro público capaz de ser replicado indiscriminadamente. É preciso ter cuidado com a Internet porque associar sua imagem pública a material autoral meia-boca pode, até mesmo, lhe custar um emprego. Daí a necessidade de avaliar e reavaliar se é, realmente, preciso publicar o que se escreve. Se o texto for pra gaveta ou pra uma pasta aleatória no computador, por mais tosco que ele seja, permanecerá inofensivo. Quando as palavras não vêm a público, seus efeitos são anulados pela razoabilidade do autor sensato. Sensatez é um pré-requisito pra se escrever. É fundamental atentar, além do conteúdo, pra a métrica e forma. A literatura não merece ser desrespeitada com brincadeiras levianas e inúteis. Um bom texto, pra ser útil, necessita causar impactos relevantes e insights produtivos em quem os lê. Os ingredientes pra um bom texto incluem: um título original, clareza e concisão, ideias dispostas de forma racional e compreensível, ambiente propício e cabeça sã a fim de dar vazão às ideias de forma ponderada. Nota: música fossa e fome não combinam com um bom texto. Corações machucados não geram bons textos. E lembrem-se: o exercício é a alma do negócio. É preciso escrever muito, todos os dias, pois a prática leva à perfeição. Modéstia à parte, este texto ficou perfeito e merece servir de base pra outros igualmente interessantes, válidos e incisivos. Porque um bom texto necessita de palavras pouco usuais. Não é pedantismo, é apenas para aproveitar todo o preciosismo da língua. Fim.
sábado, 30 de novembro de 2013
Do que não muda.
Com a vela da nau quebrada,
velejei por águas perigosas antes de pisar em terra firme. Com o mastro quebrado,
o lastro a bombordo penso, meu navio chegou mal tratado à praia. Velejando
solitário, não reconheci palmeiras tropicais, o rosto dos nativos e a própria
areia fofa preenchendo minha bota furada. Me preocupei ao estranhar o mundo de
forma tão aguda. Era como se meus olhos já não fossem meus. Era como se tivesse
morrido no mar, entre a fúria de Poseidon e os encantos de Iemanjá, e apenas
meu espírito ressurgido tivesse chegado ao continente. Já não sabia,
exatamente, quem era eu, perdido entre o marujo que saiu do porto e o pirata
que venceu a tempestade. Felizmente, eu continuava não gostando de açaí. Há
coisas que nunca mudam.
sábado, 2 de novembro de 2013
4:35 da manhã, 02/11/2013.
Tua inconsciência pesada ocupando o espaço entre eu e você na cama. Teu joelho pálido saltando da fresta do lençol. Os remédios pra minha gripe jogados por todos os lados. Nossas roupas espalhadas no quarto abafado, suspenso no tempo. Onde foram parar nossas vidas? Existe vida além do que acontece dentro da Pousada Leste? O que fazemos agora, fora da Rua Henrique Lindenberg, número 28? Nosso amor, maior que 2.500 quilômetros de terras, céus e florestas, vela um mundo cheio de bêbados, solitários, insones, tristes, carentes, perdidos. Você é o farol que, de longe, me aponta o porto seguro. Navegarei num mar de saudades, risos, abraços, ternura, beijos, afagos. Lembranças que levo no peito pra logo, logo, refazer nos seus braços. Carrego memórias junto com a certeza de que eu sempre te quis, mesmo antes de aprender a querer, ainda antes de querer. Era você que eu sempre procurei.
quarta-feira, 9 de outubro de 2013
Quando eu voltei a ter 18 anos.
Meu amor cabe em um biscoitinho da sorte,
cabe até em copo de requeijão reaproveitado.
Nasceu com quatro quilos, pobre, simples e comum.
À Thaís.
sábado, 14 de setembro de 2013
Do que só se publica quando passa.
Ignorar mágoas, inseguranças, memórias, incompreensões. Seguir. Caminhar pé ante pé, com a precisão de quem se equilibra numa corda-bamba, com a destreza de quem compreende a queda. Ter respostas automáticas, perguntas pré-programadas, dizer o básico, mostrar o suficiente, calar quando possível. Fingir que não se sabe, que não se vê, que não se escuta. O cinismo é solidão. Os espaços vazios infestam o mundo. Às vezes eu sinto que todos estão presos e que a liberdade é uma ideia inventada pela inconsciência. Queria soar menos dramático, menos afetado, menos infantil. Minha cabeça pensa, pesa, procurando certezas, justificando motivos. É preciso ser cego, vesgo, míope pra ser livre. Meus olhos tão cansados, meus óculos quebraram, minhas pálpebras são transparentes. E eu paro, olho pra o espelho, marco sinais, espinhas, princípios de rugas, imperfeições, pra não esquecer de lembrar de mim. Eu ainda tenho medo de me perder por aí, tem sido difícil me encontrar esses dias. Embaixo das camas, à espreita, o medo dorme entre a poeira e os sonhos esquecidos.
segunda-feira, 26 de agosto de 2013
Lembrete pras horas escrotas.
A inspiração é imatura e irresponsável. Afetação adolescente achar que os mecanismos racionais que
te permitem criar não podem, voluntariamente, ser acionados. Ingenuidade
esperar por um evento externo, aleatório, pra fazer algo que tu poderias fazer
se realmente te dedicasse a fazê-lo. Escrever por impulso produz ideias piegas,
superficiais, dramáticas, frágeis. Um bom trabalho requer esforço, avaliação,
critério, tempo. Não há espaço pra autocrítica se tu vomitar palavras sem
pensar em conexões lógicas e estruturas razoavelmente elaboradas. Bobagem usar escassez criativa como desculpa pra
tua inabilidade de te concentrar o suficiente pra fazer o que precisa. Tudo que
tu necessitas pra fazer o que tu é capaz de fazer existe independente de
casualidades. Gatilhos e insights são atalhos que tua cabeça inventou por
preguiça de percorrer caminhos retos e objetivos. Fatos, sensações, sentimentos
e falas não precisam necessariamente preexistir pra serem criados. A ficção
não demanda veracidade, só consistência. A liberdade tá na concretude da
criação, não na ressignificação da vida. As palavras não precisam ser ditas
pra serem escritas. A vida não é um filme esperando pra ser gravado. Tu não é
um personagem. Ninguém é um personagem. Não existem enredos prontos. Tudo
requer método, métrica, sentido, cuidado pra ser elaborado e não soar dramático. Não há histórias
pré-moldadas. Não há mágica, nem milagre. E o fato de tu ter escrito essa merda,
em menos de dez minutos, depois de olhar pra ela, não quer dizer absolutamente
nada.
domingo, 18 de agosto de 2013
Das coisas que eu pensei ter desaprendido como faz (ou nunca soube fazer)
Não há palavras. Não há verbos.
Adjetivos. Substantivos. Pronomes. Não há artigos. Não há pensamento. Há o
estar e o existir. Há ela. Há ela estando e existindo. Há seu rosto na
contraluz e sua respiração tranquila. Não há mais eu. Há ela embrulhada no cobertor
com a cabeça afundando o travesseiro. Há o quarto escuro. Não há mais nada lá fora. Não há sentido ou incompreensão. Não há
pensamentos, suposições, teorias, divagações, lógicas, preocupações, anseios,
trabalho, televisão, frustrações, complexos, pobreza, fome, injustiça, violência,
hipocrisia, pessoas, mundo. Há seus traços delicados e sua pele pálida. Há sua
inconsciência abraçando o tempo/espaço. Há o peito quieto e a cabeça vazia. Há
um nirvana, tímido, silencioso. Há o presente se espreguiçando tranquilo pela madrugada. E ela dentro nele. Não há mais nada.
quarta-feira, 31 de julho de 2013
Como eu escreveria se eu tivesse a pretensão de escrever como o David Foster Wallace pra homenageá-lo e desistisse no meio do caminho.
P:
A: Olha, não adianta porra
nenhuma eu tentar te explicar nada porque tu é limitada demais pra entender e
eu soaria grosso e tu ficaria magoada e eu ficaria emputecido, então é melhor a
gente se poupar, tu não acha? Não tô dizendo, já estás te sentindo ofendida.
P:
A: Tu quer mesmo que eu fale? Tu
vai ficar triste e eu não vou me sentir culpado por isso porque eu tô te
avisando com antecedência e não me sinto nem um pouco responsável pelo
masoquismo de ninguém.
P: ...
A: Certo. Pra começar, eu
realmente te acho uma pessoa extremamente limitada. Tua cabeça é minúscula e
tua mente é fechada. Tu é mimada e não gosta de ser contrariada. Tuas ideias
são superficiais e isso não seria problema se tu não fosses arrogante e achasse
que elas são melhores que as ideias superficiais dos outros. Qualquer discussão
contigo, mesmo que seja pela coisa mais banal do mundo, é um desperdício de
tempo pra mim porque tu te comporta como uma criança birrenta. Tua imaturidade
beira o ridículo. Nada do que sai da boca me interessa. Eu me entedio contigo e
eu adoro teu hábito de não largar a merda do Iphone não importa onde tu
estiveres porque aí eu não me sinto obrigado a interagir contigo. Eu só
aguentei tanto tempo porque tu não te importa de manter relações superficiais fingindo
que elas são alguma coisa além disso. Eu não sei se tu faz isso intencionalmente ou sem querer, mas pra mim, tanto faz, o que importa é que funciona.
Bom, funcionava, né? Eu não aguento mais, tu é chata pra caralho. Ok, tô sendo
maldoso, EU te acho chata pra caralho. Eu sei que tem um monte de gente que te
acha muito-simpática-e-um-amor e eu te aconselho a procurar essas pessoas,
sério mesmo. Essas pessoas que falam coisas tipo muito-simpática-e-um-amor porque
provavelmente têm os mesmos interesses que tu e devem gostar das mesmas coisas
que tu e que eu detesto, no caso. Sim, eu sei que pra ti eu pareço ser chato,
do teu ponto de vista, eu diria que eu sou insuportável, mas se eu tivesse teu
ponto de vista a situação nunca chegaria a esse ponto porque eu seria uma
pessoa medíocre e ia empurrando com a barriga isso, como muita gente faz,
porque é confortável e divertido e cômodo, mas foda-se, sabe? Cansei mesmo...
P:
A: Porra, caralho, eu não disse
que tu não ia gostar de ouvir!? Tu é maluca ou o quê? Tá vendo, já tô
emputecido. Sabe, isso é outra coisa que eu não suporto em ti. Tu é previsível
demais e me obriga a ser previsível e falar coisas previsíveis porque não faz
sentido falar qualquer coisa nova contigo porque tu só te interessa pelo que tu
conhece e tu conhece muito pouco!
P:
A: Porque tu é gostosa, porra!
Não é óbvio? Pelo amor de deus, sério que tu achou que eu tava contigo por
qualquer outro motivo que não fosse a vontade de te comer? Não, sério mes-mo?
Puta que o pariu, não te faz de sonsa. Eu só tô contigo porque teus peitos são maravilhosos e tu só tá comigo porque é conveniente se aproveitar do que o meu
dinheiro te paga.
P:
A: Vai te foder tu e tua
hipocrisia, caralho. Se eu não tivesse grana tu nem olharia pra minha cara,
então para com esse teu drama e essa tua ceninha que não tem nem plateia pra te
apreciar aqui. Até quando não tem gente tu quer chamar atenção, porra, para de
ser tão vaidosa! Tu nem tem porra nenhuma pra mostrar, além dos peitos.
P:
A: Não tô te chamando de puta, tô
te chamando de oportunista, é diferente. Não tem nada demais em ser
oportunista, aliás, não tem nada demais em ser puta também, mas enfim, eu não
sou otário. Olha, eu disse que seria inútil tentar te explicar qualquer coisa,
eu não disse? Tu não tá entendo nada do que eu tô dizendo.
P: ...
A: Não vem querer fazer chantagem
emocional comigo uma hora dessas. Eu nunca te enganei, sempre disse que só tava
me divertindo, que era legal e tudo mais, mas que eu não podia largar a família
por causa das crianças e essa merda toda. Tu sabe disso, eu nunca te iludi nem
dei falsas esperanças, então para de agir como idiota que tu tá começando a me
dar pena.
P: ...
A: Sei lá, porra, tu tem teu emprego
também, te vira... Não, não faz isso... Tá bom, vai, vem aqui, benzinho.
quarta-feira, 17 de julho de 2013
E foda-se.
Há o comodismo, claro. É fácil
falar de amor, paixão, sexo, o caralho. Todo mundo tem tesão, todo mundo já se
sentiu dependente, todo mundo goza, todo mundo idealiza, tem feromônio,
ocitocina, dopamina, a porra toda. Todo mundo já chorou por alguém que estava
cagando pra o que o outro estava sentindo.
Todo mundo já olhou pra cara de alguém e ficou tonto. É conveniente
amar. É confortável querer só uma boceta ou um pau pra sempre e, quando o pra
sempre estiver perto de acabar, quando não houver mais desejo, olhar pra uma
cara enrugada, um peito murcho, um saco caído, e se sentir feliz por estar ali
e não querer mais nada. Satisfazer a querência de alguém que se quer muito a
ponto desse querer sobrepor os outros quereres é uma redenção. Possuir um ser
humano, escravizar o coração de alguém, se deixar dominar pela própria
incompreensão, tudo isso é sublime. Mas querer fode tudo. A gente quer muito,
tem pouco, vai levando. É reconfortante pensar que se tem alguém que julgamos
necessário, mesmo que ninguém seja realmente essencial a ninguém. Quem pode
condenar alguém por se enganar fingindo gostar de outra pessoa pra ter o mínimo
de sossego? Quem é escroto suficiente pra olhar na cara de alguém apaixonado(a)
e explicar que seu sentimento é injustificável, que ele(a) mal conhece com quem
divide a cama, porque ninguém se conhece direito? Qual problema de querer
alguém só pra trepar, satisfazer vaidades, paranoias, compensar complexos,
afagar o ego, fugir da solidão no cinema, ouvir elogios desonestos? Falar que
não há razões lógicas pra sustentar juras eternas, planejamentos a longo prazo,
dizer que é cedo, dizer que é imprudente, não é sensato, que é possível se
apaixonar por centenas de outras pessoas mais interessantes e tudo é uma
questão de se oportunizar. É uma filha-da-putisse sem tamanho desfazer a ilusão
inofensiva dos outros por incapacidade de produzir as próprias brincadeiras. A
mediocridade também é salvação, foda-se! Eu quero mais e não tô melhor que
ninguém.
domingo, 7 de julho de 2013
Tenha sempre por perto aquilo que não é teu.
“A gente é a soma de pequenas tragédias”,
pensou em dizer. A bunda dela reluzia sob a luz distante do poste da rua. De
bruços, sentiu vontade de jogar cera quente e torna-la estátua, resumi-la a
objeto oco. Depois abriria a casa e deixaria estranhos invadirem seu quarto
para vê-la inerte. Não cobraria nada. Ninguém deveria pagar pra ver as coisas
bonitas só porque a gente vê tanta merda de graça. “Somos estrangeiros de uma
pátria sem bandeira, sem capital, sem gente, sem ordem”, ele murmurou. Ela
respirou fundo e as costelas se expandiram suavemente enquanto o cabelo lhe
caiu sobre a cara. Sentiu-se ridículo por falar sozinho e por dizer coisas
estúpidas por falta de testemunhas lúcidas. Olhou para o teto e tentou
distinguir as linhas entre as madeiras do forro no escuro. Acariciou os cabelos
castanhos dela como quem acaricia um gato gordo ronronando no colo. Nunca
compreendera muito as outras pessoas. Não acreditava em mágica, jornais, metafísica,
biscoitinho da sorte, previdência social, milhas aéreas, publicidade ou no
futuro. Sabia apenas que o mundo adormecia entre aquelas pernas.
quarta-feira, 5 de junho de 2013
Do que se espera.
A suspensão do tempo na cova
Verdade entranhada na tua carne,
eras escorrendo na tua costa
A Parságada parte do teu ventre,
rescaldos de vida soprados no teu cangote
A zoada do trânsito perturbando vizinhos,
no teu galope selvagem, cego, a esmo
seguimos ignorando imprudências
Músculos vacilando inconscientes,
tuas íris dilatando-se sobre o espaço,
realidade estraçalhada no ranger de dentes...
Meu coração relapso é teu.
segunda-feira, 6 de maio de 2013
Desperdício de espaço.
A boca dela amolada em vermelho
o sujeito penso na imprecisão do verbo
Pensa possibilidades obscenas
descaindo versos cegos
Em um pêndulo-poema
domingo, 28 de abril de 2013
Contato.
Sentia as gotas de suor empapar a
camisa, cada vez mais colada ao corpo, enquanto a náusea crescia no estômago. Pensou
em abrir o punho, largar as barras e tombar ali, desistindo do mundo. Repensou
porque atrasaria a chegada de todos que, como ele e, mais que isso,
independente dele, queriam apenas sair daquela panela.
Ela havia se debruçado, curvando a coluna mais
do que o necessário, esticando as pernas pra fora do assento. Abraçou a
mochila e fechou os olhos. Suas sapatilhas tocavam o sapato dele de leve. Ele
notou a proximidade e se permitiu virar o pé direito três graus à esquerda,
aumentando a área de contato.
A pele branca dela brilhava no
sol que incidia sobre sua testa umedecida. As sardas e sinais se tornavam ainda
mais delicados na palidez reluzente do rosto. Ele desviou os olhos pra baixo e
fitou pálpebras trêmulas, cerradas, tentando evitar o excesso de luz. O enjoo
crescia. O piercing brilhando na extremidade da orelha direita. As gotas de
suor escorrendo sinuosas na tez angelical. O cordão dourado adornando o pescoço
elegante.
O calor infernal abafando o
peito. O chacoalhar nauseante em curvas fechadas a sessenta por hora. A
paisagem uniforme desfilando veloz pela janela. O seio pulsando na respiração
quase ofegante. Caberia na boca? Ela riria se ele contasse uma piada de mau gosto?
O mormaço girando a cabeça, a ânsia na
barriga, ela ali embaixo, o calor, a censura, as contrações nos músculos abdominais,
o líquido gástrico subindo o esôfago, o diafragma descontrolado, o vômito
sujando os cabelos negros. O torpor. O medo.
Todos olharam assustados. Ela
abriu os olhos instantaneamente sentindo um nojo e uma repulsa indescritíveis pra
alguém que nunca levou uma vomitada na cara descrever. Sua pele alva estava
suja pra sempre. Limpou-se desesperadamente com a blusa enquanto ele olhava
estático. O cobrador pediu pra parar. Atônico, ele levou a mão à boca e desceu
o mais depressa que pôde.
Na saída, ainda vomitou novamente
na roda do ônibus. Ainda viu o rosto dela, assombrada, sendo limpo por uma
senhora piedosa. Ainda pensou em subir lá e pedir perdão. Ainda pensou em se
jogar embaixo do carro. Ainda pensou em perguntar sobre seus sonhos e medos. Mas ela foi embora no sinal verde. Ele no
taxi. E mesmo tão íntimos, nunca se conheceram.
domingo, 31 de março de 2013
Argh.
Tropeços em cacos de memória que fodem com a sola do meu pé. Faz três anos, provavelmente mais. Parece que foi ontem que os verbos de ligação conseguiam exprimir tudo. Eu, mesmo sem saber como ou o quê, dizia com a propriedade irresponsável dos que se permitem o drama. É fácil relativizar angustias juvenis com metáforas exageradas. É cômodo inventar sentimentos, teorizar sensações, intensificar bobagens. Sei que, no fundo, fui eu, sim, quem escreveu toda essa porcaria. Mas é difícil me enxergar no meio de frases de efeito estúpidas e histórias mal contadas. Tem tanto perdido dentro dessas lembranças toscas que me dá pena. Só de pensar que essas palavras minaram gente relevante eu sinto náusea. Queria ter sido quem eu sou pra dizer coisas diferentes, mesmo sabendo que, irremediavelmente, eu cagaria tudo da mesma forma. Só me pergunto se nem pra adubo serviu atolar, voluntariamente, tanta merda no meu peito.
segunda-feira, 11 de março de 2013
Pra ela.
Renegar
orgulhos, abrir mão de vaidades, calar diante do erro e oferecer compreensão em
troca de atos dramáticos, de dores expostas, de pedidos esbaforidos, de juras
inviáveis. Reconhecer-se pequeno, medíocre, falho, mesquinho, humano. Aceitar o
silêncio como castigo, sem espernear, calando gritos, mantendo espaços, deixar
a culpa afagando o peito. Porque, apesar da ânsia de insistir em garantias, de reexplicar
motivos, amar exige maturidade. Nada se fortalece com desgastes bestas,
com dúvidas preocupantes ou inseguranças desnecessárias. A intimidade exige
respeito. A entrega demanda braços abertos, não punhos fechados. Não há lugar pra
omissões entre cúmplices.
Entendo que
sucessões de erros são intoleráveis. Sei que há a consciência mútua de que, é
provável, eventualmente vou errar de novo. Sei que não meço o quanto posso
ferir, ainda que minha intenção, por mais idiota, não vá além de provocar. Mas a falha também me rasga quando descubro o seu tamanho. E ela me
atinge atando a minha garganta e revelando uma estupidez maior do que eu
mensurei. Há justificativas para o amor e quero manter elas íntegras. Então, mesmo angustiado, espero um consolo,
uma desculpa perdida, uma fisgada de falta. Ainda que, às vezes, eu não saiba
como, a minha ignorância, mesmo que não pareça, ainda é muito, muito pequena
perto da certeza de que eu te amo.
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