sexta-feira, 26 de outubro de 2012

Constatações.

 

      Uma nesga de luz invade a fresta da cortina e se esparrama esquálida sobre a cama. Há partículas de poeira suspensas indefinidamente, estacionárias. O sossego consome o quarto, o degenera, e já não sei se habito o quarto ou se moro no silêncio. Tudo é vulto, imediação uniforme, forma contínua ausente de princípio. As sombras ocultam detalhes e, irreconhecíveis, meus objetos são tralhas desorganizadas pelos cantos. Na estante, as palavras murmuram canções dionísicas e embalam pecados. A realidade está imaculada pelo medo cego de quem lhe inibe as vísceras. A vaidade reina lá fora. Mas meu quarto, apagado e tranquilo, é humilde o suficiente para reconhecer que não tem nada a dizer que, realmente, valha a pena ser dito. Solto um peido, amanhã não tem trabalho, durmo, sonho com Isabelle Adjani, sou feliz.

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