sábado, 14 de abril de 2012

O desuso da serventia das coisas.

      Uma das melhores formas de gastar dinheiro é usá-lo pra comprar livros fodas que eu vou ter preguiça de ler. Livros ótimos que vão ficar em cima da estante, pra eu admirar da cama antes de dormir, prometendo abri-los no dia seguinte. A preguiça vem do excesso de coisas mais práticas e inúteis a se fazer (como escrever isto, por exemplo). Deixo guardados os livros com capas misteriosas, com insetos nojentos ou bocetas raspadas, cujas páginas, escritas por gente que eu gostaria de ter como amiga, vou ler ao acaso, quando me sentir entediado demais. Os livros são refúgios que nos preenchem quando o nosso silêncio grita que nem galinha sendo assassinada.  

      Os livros que eu não leio servem pra me lembrar de que há uma descarga possível, pronta pra me levar pelo meu esgoto quando a vida ficar entupida de merda. Eu os pego da estante, passo a mão pelas suas folhas, 367, e o tato é suficiente pra eu saber que ainda existem histórias que não parecem absolutamente desnecessárias. Pouquíssimas coisas valem realmente a pena. Tenho inveja dos que não percebem (e por isso não sentem) o esforço necessário pra viver. Cultivo poeira nos livros sob a estante pra fingir que eu vou ter sempre tempo de lê-los, que viver vai sempre valer a pena, que escrever minhas próprias palavras não é, naturalmente, dispensável como os livros que eu compro e tenho preguiça de ler.

2 comentários:

Metamorfose Ambulante disse...

Acho que todos que gostam muito de ler, e escrever um pouco, têm sempre uma quantidade grande de livros nas prateleiras para serem lidos num dia especial. Seria por uma questão de segurança? Insegurança? Mania? Eu, particularmente, sucumbo às críticas/resenhas literárias instigantes: tenho que ler aquele livro! Mas sempre é mais fácil comprá-lo do que lê-lo.

TIAGO JULIO MARTINS disse...

Eu acho que compro esses livros pra poder sentir inveja das caras que os escreveram de uma forma mais intensa. haha

Mentira, eu, como tu, compro porque é uma das poucas coisas que eu valorizo ter.