quarta-feira, 18 de março de 2009

Sobre Qualquer Coisa Que Eu Continuo Sem Saber .

   Talvez minha amargura seja mesmo estranhamento perante a mim. Quem sabe, por não entender exatamente o que me leva ao silêncio, eu me perturbe tanto com a quietude. Entende-se quietude como isolamento, busca de refúgio dentro da tempestade. Porque eu sempre tive a crença besta de que se eu me entregasse às minhas dores e aos meus temores eles enjoariam de mim ou eu deles. O mais provável é eu me entediar com o que eu sinto.

   Francamente, eu queria a materialização de alguém bem à minha frente, enquanto eu estiver escrevendo o parágrafo seguinte. Então, esse alguém se postará silente, seguindo com os olhos o movimento da caneta e tentando, impaciente, decifrar meus garranchos cuspidos. É óbvio que não conseguirá ler palavra alguma, quiçá, um ‘e’, um ‘a’ ou um ‘de’, um ‘os’: elos idiotas que porventura se destaquem aqui ou mais acolá. Daí, simplesmente inventará o que sobrevém. A minha caneta será um fio de pensamento estúpido que gerará sucessões de improbabilidades. Durante dois minutos nossas respirações aflitas, como as palavras que me surgem, sugaram a matéria ao nosso redor e matarão o som. No silêncio mórbido, quebrado apenas pelo barulho longínquo que arqueja dentro de mim, eu descreverei alguém que já vi e não me lembro. Pensará em corrigir um detalhe ao outro; será que acredita mesmo que tem os olhos claros ou os lábios mais cheios que linhas marcantes? Não se importa mais, também não me custa errar agora: um erro nascido é um erro acabado. Mas receará novamente quando deduzir o fim se desenrolando com a mesma pressa que escrevo: e eu, acreditem, sei agora perto de nada. Puxará a cadeira tentando impedir ruídos, e se sentará suavemente, o corpo inteiro será surdo e mudo. As órbitas seguindo o ir-e-vir de minha mão trêmula, e suas palmas serão duas conchas apoiando a cabeça sustentada pelos cotovelos sobre a mesa. Nas pausas longas, como a que antecedeu estás vírgulas, fará menção de balbuciar a próxima palavra, mas da boca entreaberta nascerá um sorriso orgulhoso, eu ouvirei uma arfada e descobrirei o verbo seguinte. E quando me vier o impulso de arrancar esta folha e comê-la aqui mesmo, sem mastigar, alguém suspenderá o meu queixo com o indicador e me obrigará a encarar a felicidade. Tomará a caneta úmida de suor e me convencerá a ler isto em voz alta. Eu leio, e não vejo.

   Faz trinta segundos que passaram quatro minutos.

   Eu preciso ir e ninguém me veio. Este final é mesmo melancólico, porém suprime qualquer coisa que eu não sei enxergar. E há algo à frente: além dessa sequencia de cadeiras vazias, além da mágoa, destas palavras desperdiçadas e dessa bosta de sensação onírica. O desconhecido vem me torturar e, mesmo sendo rigidamente castigado, não consigo exaurir em gritos a vida que se perde aqui.

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   20 horas depois: eram risos alegres, e agora não são. Agora é perto de nada: só isto.

sexta-feira, 13 de março de 2009

Ah, vida.

 

Porque entregar-se à ?

                                                   Impulso que lhe quebre as grades ([tu]), carceireiras de         

Quem és agora? –  Perguntou-lhe depois de beijá-lo.

Livre do não saber alheio, anestesia da                                                    Estranho seria aceitar e renagar a espera por

                                                    Que me afaste do julgamento de merda, produto da incapacidade de se colocar em

 

Medo                                                                                 Indagação                                               Mais                                                                                                                   

          Acontecer-nos independe da respiração automática,

                                                                      Forma escrota que tenta nos colocar em moldes, suprimindo

o que não somos?

Nego.

                                                                                                                   

Faço a trama, mesmo que não a pontue         

Mesmo que não sejam meus os intervalos

Não escolho se aqui  sofro                                                       cheio                                                                                             e vivo

Mas eu preencho. Inteiro do que eu quero.

 

reverp  é vida

                                                                                                      

       Eu não vejo muita lógica, mas acho muita graça.

 

 

                                                                           *tristeza, cara. Tristeza.

domingo, 8 de março de 2009

Ela.

imagem

*Texto diretamente inspirado nessa foto que é uma das coisas mais lindas que já vi e não sei da onde veio.

 

  

   Ela pressupôs que a felicidade era algo latente e duradouro, mas, isso foi segundos antes de deparar-se sozinha e com medo encarando um espelho recém-rachado apoiado pelo piso e a parede.

   Como vocês devem ter deduzido, a personagem trincou o espelho, quem sabe atirando algo, em conseqüência à brilhante e genial conclusão a que chegou: ser feliz é coisa de momento. Tal magnífica descoberta talvez tenha incitado pânico em nossa heroína, levando-a a reagir de forma violenta e impulsiva. Agora, vocês esperam que eu justifique a atitude dela, visto que eu a criei e tenho total controle sobre ela, bem como seu espaço e tempo e, conseqüentemente, sei o que houve e haverá. Bom, eu não vou explicar nada.

   Com a face dividida em quatro, linhas assimétricas que a cortam da testa ao queixo, ela solta gargalhadas, quase sem sons, intervaladas por momentos em que lhe falta o ar. Riso baixo, forte e ameaçador. Sorri como se tivesse conhecido o que há de mais engraçado no mundo. Contorcendo-se no chão, mão à boca, sem pudor algum. Às vezes de olhos fechados, e, quando torna a abri-los, surpreende-se com a imagem que enxerga refletida e não se agüenta: dá outra risada ainda mais forte que a anterior. Lágrimas escorrem, e todo mundo chora de tanto rir. De novo e de novo.

   Então, dez minutos depois, ela está exausta. Estirada num canto, sente cada pedaço do corpo dolorido e os músculos da face completamente dormentes. Ela tenta rir só mais uma vez, mas mover bochecha dói, esticar os lábios dói, franzir a testa dói e fechar os olhos dói insuportavelmente. Porém, nossa intrépida amiga é insistente e teimosa: num ato que apenas podemos interpretar como um caso claro de masoquismo, ela continua a admirar o espelho e lançar risinhos esparsos que lhe trazem uma dor aguda e puxam gemidos tímidos. Brotam mais lágrimas e elas se confundem, todas elas.

   Deitada de bruços no chão frio, fixando o espelho, ela sente uma leveza que nem sabia que existia. Posso dizer que ela sente independente do corpo, como se não tivesse corpo. Aliás, ela é só uma personagem literária e fictícia, então, teoricamente, ela não tem mesmo um corpo. Está ali, dormindo calma e serena como um sorrisinho meigo que me acalenta e traz paz.

   Uma história não continua sem personagens. Como eu não sou interessante e seria um despropósito acordar a moça, vamos encerrar nesse parágrafo. Morta ou sonhando, tanto faz, o final é feliz e o momento é eterno.

domingo, 1 de março de 2009

Poeminha Contra A Reclusão Para Os Dias Muito Ruins.

Eu peso em carga grande e densa

O peso que sustento; hora explosão, hora silêncio;

Pulsa amiúde sob meu cerne fatigado

Ansiando impaciente qualquer parva forma

Pretexto que dou-lhe apenas para vê-lo livrado.

 

Preso, pois, meu peso jaz como angústia sepulcral

Este meu pesar; hora apatia, hora desespero;

Vela um sonâmbulo triste e inerme

Incapaz de atirar-se nos sonhos que o rodeiam

Patético frustrado que nem peleja e, já por isso, perde.

 

Então, eu, que ambiciono e insisto

Empunho isto, digamos: vida; hora feliz, hora apenas poesia;

Para dizer-lhes, com sorrisos e lágrimas que me ratificam,

Sejam para fora: renunciem às insignificâncias que inibem alegrias

Posto a felicidade estar além de nós; visto não cabermos diante tamanha vida.


De depressivo à feliz da vida em três estrofes. (: