sexta-feira, 26 de setembro de 2008

Reticências.

Eu abri mão da ilusão mais doce que já me apareceu por pura covardia. A fraqueza mais estúpida da natureza humana, característica dos medíocres e dos cegos, fez-me fechar os olhos e esconder minh’alma da encarnação límpida materializada pouco a pouco no tempo vão e sem profundidade desses anos.

Surgiu do acaso, como todas as coisas certas surgem, e me apareceu com olhos úmidos, assim: de braços abertos, vertendo poesia por todos os poros e com o coração oferecido numa bandeja de ouro. E eu olhei-a... Eu não quis crer, e depois de avaliar as conseqüências, após enxergar apenas o lado ruim e como ele inteiro poderia me foder, eu optei por me trancar do lado de fora.

Ah, quanta estupidez... O cara que sempre criticou a racionalidade e a lógica, como a combinação excessiva das duas é capaz de sugar toda a mágica da vida, começou a avaliar minuciosamente uma situação que nem real era: porque, de tão extraordinária, eu não tinha nada palpável, ou certo ou mesmo previsível pra analisar, não podia tentar montar um quebra-cabeça porque as peças não tinham formas definidas.

Segui meu rumo tratando-a como um mero elemento a mais, um pedaço de terra novo pra pisar e brincar de atirar contra o vento. Eu, sem perceber (ou sem querer perceber), fui respirando-a e absorvendo-a com uma placidez e ingenuidade dignas de pena.

Letras, e palavras e rimas e depois poesia, poesia, letras, músicas, letras, palavras, músicas... Eu, que sou dado às abstrações e às futilidades, realmente pensei que poderia experimentar a intensidade, quase dolorosa de tão sutil e natural, brotando da menina de beleza mais delicada, encantadora, pura e terna que eu jamais vi... Não, não vou tentar descrevê-la, não iria conseguir substituir com letras aquelas formas.

Tempo. É, de novo falo do tempo, e de novo isolo-o numa oração e coloco um ponto em seguida. Não, eu não mudei minha visão: tempo mata, matará ou transformará tudo. Mas ele me enganou dessa vez, porque ela afastou-se de mim (quanta ironia...), e eu achei realmente que havia me acostumado à ausência daquilo que chamei de mentira. Claro, pensava nela, mas já era uma lembrança, e só. E quando meu peito começava a apertar, eu simplesmente ignorava a dor e procurava outra coisa pra botar em seu lugar: palavras idiotas, merdas, enganos, coisas poucas, risos fáceis (tão diferente dos de antes), tanto faz.

Nos dias seguintes a dor tinha cessado, em alguns eu conseguia passar 24horas sem ao menos lembrar-me da existência dela. Mas aí chegou o hoje... Chegou o agora, veio à hora antes dessa, veio à bala e com ela a ferida que nunca havia cicatrizado.

Estava rindo com um amigo (raro: o melhor, mais importante e talvez o único) quando resolvi testar minha cura, e... Veio isso: a continuação, o prolongamento, o hiato, a imagem que jamais sumiu da minha tela branca.

Vou beijar, namorar, trepar, escrever e ainda lembrarei dela. Ao menos uma vez todos os dias, pelo menos à noite.

4:26 da manhã, a Adriana Calcanhoto fala sobre estrelas no meu ouvido enquanto pergunta para quê, e, talvez, ela esteja vendo as mesmas que eu. Chorarei muito semana que vem.

quinta-feira, 11 de setembro de 2008

Vômito.

Às vezes as cores desbotam antes mesmo da tinta secar. Esse quadro preto e branco hoje tem um tom de cinza diferente: velho e deprimido. Há coisas que sempre serão velhas, mesmo se forem nascidas apenas há alguns segundos. Carregam o tempo na essência, na idéia de coisa, antes de serem sólidas e só existirem em idéia. Algumas idéias serão velhas e imortais. O tempo. Acho que o tempo mata ou matará quase tudo, menos as idéias: distorcidas, ignoradas ou esquecidas, mas sempre vivas, mesmo que suas vidas sejam inúteis e desconhecidas.

Minhas coisas existem e fluem apenas como idéias. Mas eu não vivo à margem do tempo, o meu tempo corre e minhas idéias passam resignadas ao seu lado, e eu espero, em vão, que ele as distenda até nossa realidade para eu tocá-las. Sim, porque por mais distante ou desencaixado que eu possa parecer (ou ser) ainda estou aqui, e por estar aqui é que não sou alheio ao tempo. Penso em mim como um buraco negro ao contrário: que cospe ao invés de sugar, que dá e não recebe, aquele perdeu o brilho não por roubar a luz, porque nem há luz. Buraco negro perdido, que gira em torno de si, fica tonto e vomita. Que é, mas não cabe.

Agora eu sinto uma solidão única, absurda e injustificável. Talvez eu seja ao contrário, mas o vazio é o mesmo, eu jorro meu tudo e o vejo, impotente, ser esvaído e sucumbir até tornar-se nada. Sou coisa alguma. E me entregarei sim às efemeridades e às diversões baratas, furarei meus olhos para me contradizer e me anular. Porque assim eu não me sou mais tão necessário.

Falava ontem que uma vida sem sentimentos é superficial e seca, não vale o esforço. No entanto o esforço é só mais uma das minhas idéias de coisa. Dentro de coisas estúpidas, eu vou adormecendo as idéias daquelas que valeriam a vida, o esforço e até sua própria existência. Sentimentos são só idéias disfarçadas de poesia, carecem virar coisas. Carecem, necessitam muito.

Falta incomensurável essa de hoje. Restam esses caminhos finos criados pelas gotas de melancolia por onde escorrem as palavras para me fazer companhia, é o que está mais próximo de mim e me ilude deixando as minhas idéias mais reais.

Ainda morro de velhice qualquer dia desses.

Sinto-me caindo sozinho e desamparado num abismo gigante feito de ar rarefeito, vou dormir sufocado antes de me despedaçar no chão.

quinta-feira, 4 de setembro de 2008

A.I (auto-ironia)

Bom, eu sei: não preciso fazer isso. A internet tornou-se um imenso espaço público, e eu não tenho obrigação nenhuma de me justificar ou dar satisfações a ninguém. Mas depois que comecei a postar o que escrevo desenvolvi uma relação estranha com o blog e, conseqüentemente, com as pessoas (de gosto um tanto duvidoso) que o freqüentam regularmente... ou quase isso. Metalingüística é uma das minhas figuras de linguagens preferidas: acho interessante, divertido e instigante falar sobre o que se fala. Deve ser coisa de gente meio perturbada (disfuncional mesmo) com mania de querer conhecer os outros instantaneamente (enquanto provoco constrangimentos e causo a impressão de que a minha maior diversão é tentar coçar com a mão destra o cotovelo direito).

Quero esclarecer umas coisinhas importantes para evitar alguns possíveis (novos) inconvenientes: o blog não é um diário, não é literário, não é fictício, não existem terceiras pessoas (haha. tá, isso é mentirinha e eu sou muito cínico), não é inteiramente factual e, por hora, eu não faço uso de psicotrópicos nem me valho de mensagens psicografadas do além para produzir os textos. É um espaço despretensioso, pessoal (quem sabe filantrópico, caridoso e, quiçá, surrealista além de um pouquinho subliminar) que uso para ressoar meus berros abafados.

Já falei antes, repito: em primeiro lugar, eu escrevo para mim. Escrevo porque preciso, dependo. O que está aqui não está aqui para ser censurado ou idolatrado: é para ser lido, abstraído, engolido, captado e só. Caso não goste: vomite, me ignore e diga que tudo não passa de uma bosta fétida gigantesca e intragável (adoro essas críticas construtivas). Agradeço muito, mais uma vez, a quem comenta os textos. Não vou negar que me sinto mais confortável e contente ao saber que não estou falando sozinho, como um louco... Ok, como um louco que não tem consciência da loucura.

Rodeios a parte, tenho que confessar que ando sem saber o que dizer (ou inventar, como preferir). É estranho isso: de um jeito ou de outro, eu acabei criando um compromisso que eu, sinceramente, gostaria de ter dispensado. Quatro dias, cinco ou seis no máximo, foi esse o prazo que dei a mim mesmo. Aliás, hoje vence o prazo, o que quer dizer que se alguém estiver lendo isso agora, saiba que eu estou levemente desconfortável. Se não conto é porque não tenho vivido o suficiente, ou com a intensidade que gostaria: “a vida não é a que gente viveu, e sim a que a gente recorda, e como recorda para contá-la.”, já dizia García Marquez.

Éca, tô com nojinho de mim. Isso aqui tá parecendo: “Querido diário, eu tenho andado com muiiiita preguiçinha mental e não vou salpicar palavras confeitadas de alegria em suas páginas perfumadas, e nem te contar meu novo segredinho cor-de-rosa agora. Mas eu ainda te adoro de montão, hein. Beijos estalados com glitter”. Argh, uma lástima, olha. É isso que dá ficar vendo a maratona especial sobre o canto das baleias no NatGeo, embaralha os ralos neurônios psicóticos do cérebro da pessoa (falando nisso: alguém que dedica sua vida a estudar o comportamento reprodutivo da foca-monge-mediterrânica, que a mesma viu somente uma dúzia de vezes durante toda sua vida, muito provavelmente não tem grandes aspirações. No mínimo sofreu um forte trauma emocional [lê-se sexual] na juventude, só pode).

Tenho a leve impressão de que escrevi esse besteirol apenas para dizer que o eco do texto anterior durará mais alguns-não-sei-quantos dias. Se chegaram até aqui sem dar uma risadinha e estão embasbacados com tanta porcaria, e só continuam porque são movidos pela inabalável fé de que ainda há algo com o mínimo de decência por vir, vou desapontá-los mais uma vez. Pararei por aqui mesmo, desde o “querido diário” eu estou com muito, muito medo de mim.

Procurando algo que realmente mereça alguma atenção, aconselho ler a *Camila: algumas das minhas palavras se perdem dentro das palavras dela.

*memoriasdapoeria.blogspot.com