quinta-feira, 28 de agosto de 2008

Cândida Reza.

Naquela noite, eu desfrutava da aprazível companhia de minha invencível solidão e da insônia que até hoje insiste em me perseguir querendo sabe deus o quê. No escuro eu ensopava de suor graças ao calor infernal, sentia um cheiro de éter velho e a brisa porca do ventilador atirava poeira contra as minhas narinas. A televisão estava sem sinal, eu me distraia com aquele zumbido irritante enquanto ela projetava faíscas pretas descontroladas no meu rosto. Deitado com o peito virado para o teto, mãos na nuca, olhos acompanhando as linhas paralelas feitas pelas madeiras do forro: pensava no dia repetido, no meu isolamento costumeiro, nas pessoas que perderam o gosto, em gente desconhecida, em hipocrisias, no sono, na história, até que finalmente cheguei a ela.

Daquela vez eu sorri quando me lembrei dela, sorri porque eu estava fazendo papel de idiota, pior: um idiota absolutamente consciente e que reprovava sua idiotice. Nessa madrugada tediosa quando eu recordava dela, só vinham à tona frases raras, um rosto angelical e uma voz de ninar. Era o resumo mais fantástico que eu já tinha feito de algo ou alguém.

Eu tinha palavras, traços e som: era o ator coadjuvante do meu próprio filme surrealista. Ela e eu no meio de uma plástica dissonante de letras, formas e barulho.

O óbvio era imprescindível para introduzir o que aconteceria posteriormente (esse é mais teu que meu):

Fechei os olhos por seis segundos para vaporizar a sujeira e o lixo do quarto numa fumaça pesada e palpável, era necessário criar uma atmosfera noir antes de encaixá-la, caso contrário, o resto não teria o menor sentido. Levantei as pálpebras e o quarto estava tomado por uma neblina sépia-desbotada, ela dançava valsa embalada pelos sopros do ventilador que volitava no breu produzindo mini-tufões enquanto eu admirava-o espantado. Ele zombava de mim com ciclones cínicos vindos de suas piruetas acrobáticas: o vento girando em sentido horário era o inverso do assombro que eu já havia previsto, mas tentava, em vão, atrasar. Susto é vento violento.

Quem gravava a cena, sem cortes, era uma micro-câmera posicionada nas costas de um mosquito bêbado que vagava pelo ambiente transpassando a luz vinda da televisão, ela nesse momento cuspia pontos pretos minúsculos para todos os lados que, depois, voavam como um enxame de vaga-lumes mortos. Como não consegui distinguir o mosquito no meio daquele carnaval sem cor, cada ponto preto era um olho meu: desconexo, incontrolável, perdido, confuso, dela.

Já não tinha intervalos suficientes para ter medo: estava atônico observando os olhinhos negros filmando, no mesmo segundo, múltiplos ângulos que convergiam no centro do quadro praticamente vazio.

A televisão havia se despido de quase todos os seus grãos, e agora era apenas uma tela branca silenciosa que produzia um brilho alvo, meio opaco e muito melancólico, que atravessava a névoa com dificuldade e dissipava-se, uniformemente, pelo resto do quarto transformando objetos em silhuetas semi-reconhecíveis.

Quando o último grão desprendeu-se da superfície de vidro da TV e juntou-se aos outros, foi surgindo vagarosamente na tela o rosto dela, é inútil tentar descrever sua beleza. A interferência que antes nos afastava e a prendia naquele mundinho paralelo, diminuto e incolor, finalmente havia desistido de nos atrapalhar e passou a contemplar ansiosa a cena: escreveu a história e sabia como terminaria. Os pontos esperavam para conhecer o pós-fim, daquela vez não existiria recomeço (ah, o sadismo... Conheces?).

Eu fiquei sentado com a costa apoiada na cabeceira da cama, braços cruzados, coração acalentado e com a visão fixa nas formas primorosas que construíam o rosto dela. Ela sorriu cintilante para mim de dentro da pintura e eu lhe respondi piscando o olho direito. Então eu já não precisava fazer coisa alguma.

Trinta minutos, ou talvez três horas, noites, tanto faz.

Foram poemas de amor, discursos existencialistas, muita euforia, palavrões, condenações, cansaço, lamentos de velhas paixões, saudades, nostalgias, conclusões a respeito da felicidade e da tristeza, declarações abafadas, desejos íntimos, constrangimentos, ideais de perfeição, verdades indiscutíveis, alegrias, ânsias e uns olhares molhados pela cumplicidade. Eu variei entre risos, perplexidade, admiração, prantos e ausência. Ela vomitava-se sobre a minha solidão e eu permanecia mudo. Era inútil falar qualquer coisa: ela conhecia, entendia, refletia e compartilhava cada uma das minhas palavras escritas, pronunciadas, perdidas ou abafadas, junto de todas as suas combinações possíveis ou improváveis... Ou talvez não, mas ela tem uma criatividade gigante e encantadora, acho que não teria dificuldade para me completar.

Enfim, após esvaziar-se inteiramente e me encher dela até chegar ao ponto de dilatar os meus mais remotos limites, depois de depositar-se em mim, a minha vida fundiu-se a dela numa existência só: fluído químico homogêneo que reagia no meio daquela circunstância metafísica inexplicável.

Além das fronteiras de mim, depois das fantasias, no avesso da poesia, perto do fim dos significados e das palavras não existia nada, fora o vácuo, mortificando-a naquele universo paralelo que a separava de mim por kilômetros longínquos dentro de tempos intermináveis. A única coisa que nos ligava eram suas palavras multicoloridas pela minha compreensão.

Quando ela finalmente calou-se, permaneceu com a feição fechada por uns segundos, estava séria e tinha os olhos tristes. Deitou seu lindo queixo na mão esquerda e confessou, num tom exausto e com a voz embargada, que a única coisa queria naquele momento era mandar o mundo e tudo que há dentro do mundo ir à merda. Então eu não me agüentei e, por fim, reagi com a intensidade que ela merecia: gargalhei. Eu ri um riso inocente, mais arrebatamento que brincadeira, mais desabafo que riso, mais lágrimas do que dentes, mais ternura que descontração, mais um “eu te amo” impronunciável.

Furei a bruma e aproximei-me da televisão num salto desajeitado, com a cara encharcada e entupido daquela felicidade imensa, acompanhei os traços singelos acariciando a tela com o indicador. “Que vá todos e tudo à merda”, falei-lhe radiante. Mas ela permaneceu estática com a mão apoiando a cabeça, o olhar desencontrado, produzindo aquela atmosfera infeliz e com os pensamentos... Não sei onde estavam... Realmente não sei... Claro, claro que sou tentado a acreditar que eles eram meus, mas... Como poderia definir algo no silêncio remoto? Silêncio sem formato, infinito, reservado, envolvente, meu silêncio roubado e desconhecido.

Repeti minha única fala três, seis, nove, vinte e sete, cinqüenta e quatro vezes. Repeti quando ainda tinha esperança, repeti quando não quis acreditar, repeti quando já sabia, repeti gritando, repeti chorando, repeti furioso, repeti conformado e repeti sem voz, depois eu apenas rezei em silêncio, sem repetir, pedindo com todas as forças para que ela soubesse da minha inútil presença distante.

A televisão desligou-se, a mágica do ambiente pereceu instantaneamente. O ventilador caiu no chão, a neblina desfez-se, e o enxame de vaga-lumes mortos bailou imponente antes de sumir. A interferência, enfim, havia ganhado e provado ser imbatível perante a mim, mostrou-me que imaginação não concretiza o impossível nem distorce o inevitável. O quarto foi engolido pela penumbra mórbida, e o meu filme morreu com o mosquito bêbado que não pôde com a sua solidão. Eu permaneci de joelhos, orando.

Num momento dúbio de lucidez, eu cheguei à conclusão de que escrever, fora milhares de outras sensações, qualidades e definições possíveis, é encarnar um deus que não existe: foi para esse deus que eu roguei e vendi minha alma naquela noite.

Pós-Fim.

domingo, 24 de agosto de 2008

Caleidoscópio surreal girando na velocidade do som feito pelo Portishead.

De longe, com a respiração controlada, os olhos inertes, a boca seca, os pensamentos soltos e uma frieza desumana, eu analisava-a fixamente. Oito metros, quinze passos em linha reta.

Nota memória: Não sei o que estou fazendo.

Agora eu sou um caleidoscópio surreal girando na velocidade do som feito pelo Portishead.

Criticar. Estava pensando nisso esses dias: iria encaixar alguém, analisar, realçar defeitos, falar do que não gosto, iniciar um debate moral idiota ou uma discussão de valores totalmente dispensáveis.

Olhava-a e pensava nela simplesmente porque não havia outra coisa a fazer. Porque eu estava só com as minhas palavras, e elas voam sem rumo dentro de mim se chocando uma contra as outras até caírem no abismo do meu esquecimento. Há partes de mim que nem eu alcanço.

Porque eu não sei mais o que fazer, por isso junto as letras nessas frases soltas, é difícil entender pois não era a minha intenção inicial fazer isso.

Eu perdi a linha, não tenho referencial. Eu só tenho um ponto: a liberdade.

O que não me agrada é a idéia de permanecer afastado de mim. Se eu me jogo assim, sem medo, é porque eu sou covarde demais pra permanecer à beira do abismo.

Lá não importa onde é: o lugar conta menos, o espaço é só um detalhe técnico. O que é importante é o que eu escrevi lá, e o que eu escrevo não é matéria para ocupar espaço. Vou sempre estar onde estou, e onde eu estiver minhas palavras estarão comigo: porque eu sou palavras, significantes, verbos e nomes. Já disse isso: duas ou cinco vezes, e eu vou repetir até eu me convencer completamente.

Porque o que eu escrevo é energia: pura, limpa, suja, forte, sutil, imperceptível, destruidora.

Porque eu não amo.

Pode ser qualquer uma, e em nome de todas, eu espero.

Ela perguntaria:

- Por que estás fazendo isso?

Eu lhe diria:

- Nada. Tu és só um molde.

- Estás esculpindo o quê?

- Isso.

- Precisa do meu rosto para iniciar um pseudo-diálogo que nada mais é do que um monólogo para tu satisfazer tua necessidade básica?

- Não, teu rosto é só uma desculpa: um argumento para eu te mascarar de mim.

- No fundo, querias que eu fosse tu.

- És viciada como eu, faria o mesmo na minha situação.

- Qual tua situação?

- Essa.

Preciso de alguém que escreva comigo, por mim. Eu estou cheio demais de mim, tão cheio que não consigo sequer definir uma forma.

- Quer que eu diga o quê?

- Melhor a minha mudez e o teu rosto. Dane-se a poesia das palavras, não dá pra compartilhar o que transpira de ti.

Como um muro branco: posso te pintar, ignorar, pichar, pular ou derrubar.

Sou um vagabundo miserável.

Eu não te temo, tu me destróis e eu me sinto radiante em cacos: multiplicado sobra mais espaço pra ti.

Quinze metros, oito passos em linha reta.

Continuas sendo a minha ilusão mais doce, meu melhor engano: mesmo depois de te desfazer, do mesmo jeito que eu te inventei, continuas como parte de mim. Sabes disso, no fundo sabes.

Eu te quero acima de tudo, e tudo não faz falta se estiveres comigo. Eu quero que o tudo se dane e o pouco também. Que reste apenas nós.

Porque, um dia, eu coloco um ponto em seguida nessa história absurda que eu comecei. A partir desse dia eu te terei e vou te sentir com toda essa droga desconhecida que eu tenho dentro de mim.

Eu vou te amar com toda essa intensidade mesmo tendo também a certeza absoluta de que terei uma depressão proporcional nos dias seguintes.

É invevitável: o tempo é um rolo compressor impiedoso que esmaga (e renova) os corações inquietos daqueles que pensam mais do que podem.

Deus deve ser tempo.

O que eu mais queria é saber como reages pra eu finalmente sentir, com convicção e força, que estou vivendo.

Não sinto mais nada além de indiferença por ti. Tu és só um pretexto insignificante, que fique claro.

Tu estás feliz, eu estou apático. Não que isso me incomode, mas é que não mereces essas merdas: ninguém que esteja bem merece a angústia do outro.

Não é só pra ti, é pra todos.

Foda-se. Eu me sinto muito melhor agora. Às vezes eu preciso abrir um buraco em mim pra me deixar vazar.

Não sou egoísta, por isso peço perdão a quem lê. Peço compreensão também, eu acho que esse é só o primeiro de uma série de retalhos.

O eco dessas palavras não me deixa dormir.

Eu ando muito, sem nexo nenhum.

terça-feira, 19 de agosto de 2008

Eterna Ânsia.

Dedico a ti: metáforas grosseiras; linhas tortas; delírios ilimitados; mentiras lindas; horas vãs; segredos íntimos; coreografias exaustivamente ensaiadas; torturas ternas; bobagens divertidas; dramas líricos; cenas de ação; diálogos metalingüísticos; ócios enlouquecedores; sorrisos falsos; verbos de ligação; esperas intermináveis; fraquezas explícitas; enganos anestésicos; rimas de merda; dias sem início ou fim; lágrimas raras; contradições justificáveis; mensagens subliminares; desesperos secretos; as cicatrizes imortais; alegrias medíocres; perfumes doces; batidas fortes; a parte maior do todo; o resquício de vida; os desejos reprimidos; as cores mais vivas; a melancolia amiga; os votos falsos; as escolhas aleatórias; a saudade do que nunca existiu; as ironias idiotas; o cheiro de chuva das madrugadas; os tons de cinza; a franqueza desnecessária; o medo do desconhecido; os erros imperdoáveis; a esperança burra; a mudez opcional; o barulho interno; as atitudes infantis; as condenações preconceituosas; os pensamentos que não são teus; as abstrações surreais; o conhecimento mais miserável; os exageros mais escrotos; a estrada de palavras embaralhadas - mais caminhos que fins.

A ti que é alimento, que me faz sobreviver, me machuca, me desilude, me fere, e que me lembra; a ti, que apesar de teres ganhado algumas belas formas, não tem nome; a ti que não tem lugar no espaço-tempo; a ti que é o que mais quero, apesar de desconhecer-te; a ti que me ignora; a ti que eu clamo: dedico a ti, da pessoa mais covarde de coração mais estúpido, a mais sincera poesia.

sexta-feira, 15 de agosto de 2008

Para a Menina.

Ah, menina, uma hora dessas quem sabe lês isso. Provavelmente irá gargalhar espalhafatosa com toda tua imponência, visível mesmo sem a tua presença. Vais rir por minutos sem mostrar os dentes; ainda não sei como são teus dentes e, nem de longe, sou do tipo que é dado a imaginar coisas impossíveis e que, muito provavelmente, nunca existirão. Farás apenas uma meia-lua gigante com teus lindos lábios rosados.

Sentirás vontade de me bater também: aquelas tapinhas sem força feitas de carinho, porque o que vou dizer talvez te deixe um pouco sem graça, um tanto quanto constrangida. Espero, sinceramente, que um dia eu esteja do teu lado para que tu me espanques até eu não conseguir sentir mais nada. Não, não descobriste agora que sou sadomasô. É que para mim seria uma honra inenarrável ter contato com tuas brancas, cálidas, pueris, singelas e delicadas mãos mesmo que isso me custasse à invalidez de algum membro.

Sei que a ironia já começou a escorrer, mas não posso evitar, ela vem direto da fonte: minha contradição combinada à consciência de que estou sendo ridículo. Vontade de escrever sinto constantemente, às vezes não sei sobre o que falar nem como direcionar isso sem parecer idiota, mas eu juro por tudo que é mais profano, que não fiz essa colocação para justificar coisa nenhuma: não estou escrevendo a ti por falta de opção melhor, ou de criatividade, ou boa-vontade, ou escassez de histórias, ou ausência de sentimentos , ou qualquer outra coisa relacionada às anteriores.

Escrevo a ti por um motivo infinitamente mais nobre e importante: és bonitinha, e coisas bonitinhas me inspiram. Possuis também minhas doces palavras porque tu roubaste meus pensamentos, menina - depois de uma dessa e uns três litros de álcool até eu casaria comigo. Não posso te explicar como isto funciona, teria que recorrer a cálculos físicos complicadíssimos e a filosofias de banheiro complexas demais para ti.

Não, não acho que sejas incapaz, muito pelo contrário: no meu julgamento dispensável e totalmente baseado em preconceitos bestas e impressões superficiais, eu percebi que tens lá os teus lapsos de lucidez intercalados entre uma expressão estúpida e a adesão de uma modinha idiota.

Aliás, deverias procurar um jeito melhor de expor tua imaculada personalidade. O que fazes além de ser nitidamente exagerado é um tanto quanto forçado. És diferente, não é necessário se igualar aos outros para ser o que já és. Não precisas provar coisa nenhuma a ninguém, menina. Parecer rebelde e descolada são atitudes típicas de pré-adolescentes imaturas que sofrem, sem perceber, crises de identidade enquanto idolatram a bandinha da vez e tentam encher o perfil do Orkut, quando não estão a entupir-se com umas besteirinhas recém-descobertas.

Vou te contar um segredo: uma grande parte do mundo é só um conjunto de incoerências temperado com pingos de hipocrisia & egocentrismo; as pessoas estão ocupadas demais satisfazendo sua ânsia por diversão barata e tentando promover elas mesma; distraídas com os próprios narizes não tem como olhar para o teu, por mais lindinho e empinado que ele seja.

Tua beleza é realmente radiante. Mais que isso: ela é inspiradora, e graças a ela escrevo palavras tão ternas e carinhosas a ti. Não mais me valerei de metáforas para te descrever, serei claro como tua casta pele: teus traços europeus misturados a tua aura mágica de ‘‘estou bêbada, sempre’’ te deixam incrivelmente bela. A aura de ‘‘estou bêbada, sempre’’ é tua maior graça, menina.

Tenho gosto exótico, eu sei. Mas sem ele eu não teria amor próprio.

Admiro-te atentamente tentando respirar tua beleza e quase sempre tenho a impressão de que estás num estado etílico ligeiramente elevado. Acho até que senti o cheiro forte do uísque vindo de ti e da tua garrafa enquanto tentava respirar a beleza numa foto tua.

Ah, escreves bem... Escreves mesmo. Vai ver é isso que te deixa bonitinha a ponto de me comover e escrever coisas tão açucaradas. A capacidade de expressão verbal é uma das coisas que mais aprecio em alguém: revela um conteúdo nosso que é oculto, de certa forma, é meio complicado chegar nele quando estamos no meio de todos. Revela uma consciência reprimida; gostei da tua consciência reprimida, menina. Ela não parece bêbada, tem um charme maior ainda: é ligeiramente perturbada. Não me entende mal, não falo pejorativamente, gosto da anormalidade: acho que aumentam teu sex-appeal esses leves desvios psiconeuróticos.

Acho-te encantadora, menina: inteligente, linda, sexy, agitada e bêbada.

Espero, de verdade, que uma hora dessas leias o que eu escrevi com tanto afeto; eu acho difícil, mas enfim. Não importa muito saber que é teu, só queria que captasses toda poesia transbordada de ti e moldada por mim.

Falaram-me uma vez que a tia Esperança é a última que morre e a primeira que ressuscita. E eu tenho muita fé de que algum conhecido em comum cruze nossos destinos e te mostre as tuas palavras; e é só, apenas e unicamente por isto, que compartilho com o mundo o que era para ser somente teu.

Ficou maior do que eu pensei que ficaria. Talvez eu continue mais tarde. Preciso te dizer de novo: Possuis também minhas doces palavras porque tu roubaste meus pensamentos. Eu pensei melhor em ti; percebi que nosso casamento não é coisa tão remota, o mais difícil é tu leres a frase.



Beijo na boca, Menina.

segunda-feira, 11 de agosto de 2008

Enjôo.

1:39 da manhã. Sua cabeça estava pesada, os olhos ardendo e o coração apertado. Apesar disso, dos dias, das 18 horas, do sono e das angústias, ainda atingia-o a estranha indiferença que agora, por vacilo e consecutivos imprevistos, passou a latejar.

Precisou desligar-se, apagar e calar-se. Aliás, não precisava, apesar de ser do seu agrado, não era carência de silêncio: ele quis. Não foi um desejo voluntário, não fez força, não era necessidade também. Apenas perdeu a vontade de envolver-se.

Ele, o gosto, simplesmente ausentou-se sem avisá-lo previamente; não era ele que pertencia o gosto: o gosto era seu dono, e decidiu torturá-lo. Faltou paciência, faltou disposição, faltaram palavras, faltou prazer e lhe restou um embrulho no estômago, uma náusea esquisita.

As caras, os gestos, as falas, as graças e os jeitos transbordaram os limites que ele mesmo desconhecia. Encheu-se delas. Havia chegado ao limite da pretensão: roubou por completo o que
tinha para ser roubado dentro das restrições legais, íntimas, físicas e emocionais.

Não ofereceram mais o que lhe interessa, e apesar de sua postura assumida, e claramente egoísta e egocêntrica, é só isto que lhe sobrou na falta do que mais queria: sua mais simples e
inútil constatação.

Encarava a situação friamente, e passou a associar e resumir a complexidade extraordinária de que são feitas as pessoas à simples notas músicas. Precisava de melodias novas, atraentes e envolventes para escutar e substituir o que se tornara um barulhinho insuportável. Foi, possivelmente, a repetição exagerada: o contato direto, o fim das idéias, das graças ou dos encantos. Sei lá.

Carecia do novo, e dessa vez, para sua infelicidade, é precisamente esse o verbo. Necessidade absurda de descobrir o que não sabe; explorar mentes diversas; analisar e entender; ter acréscimos; risos novos; assustar-se com diferenças, ou semelhanças até, mas, isso era mais complicado.

Talvez estivesse sendo forçado a redescobrir o que já conhece, entretanto isso não dependia dele. Criava estórias espalhafatosas, inventava sentimentos ternos, fazia mentiras apropriadas, porém, suas barreiras internas não lhe permitiam determinar os atos certos para as palavras.

Ou quem sabe toda essa droga estivesse sim em suas mãos e lhe tenha faltado pulso, coragem e confiança para chegar a outros pontos; quebrar umas barreiras; contrariar umas vontades; evolver uns relacionamentos; calar umas bocas com a sua. É uma pena que sintonia não exista sem ao menos dois pontos.

Quem sabe...

Faltava muito. O pior, mais triste, irônico e divertido, é que somente ele mesmo poderia dar-se o que lhe supriria. Não tinha tais coisas porque na sua visão, que ele apelidava de realista, mas na realidade era o inabalável pessimismo traduzido de suas inseguranças, elas quebrariam outras.

Detestava a coerência das coisas, elas sucessivamente lhe acabavam no final de cada probabilidade.

Solidão foi conseqüência direta e inevitável, mas foi escolha também, pelo estúpido fato de que não existia uma melhor: era a sua opção, a falta dela.

3:23 da manhã. Minha cabeça está pesada, meus olhos estão ardendo e meu coração está apertado. Falta paciência, falta disposição, faltam palavras, falta prazer e me resta um embrulho no estômago, uma náusea esquisita.

quinta-feira, 7 de agosto de 2008

Engano Lógico.

Chegou ao consultório odontológico ofegante, a chuva desabou antes do previsto. Vinte segundos correndo foi o suficiente para deixá-lo ensopado, cansado e desarrumado. Estava conformado com as duas lentas horas que teria que esperar até ser atendido: lá, não importa a hora marcada para a consulta, a agenda é mal organizada e os pacientes são atendidos por ordem de chegada. É mais lucrativo assim.

Quando entrou na sala de espera notou que já havia uma boa quantidade de pobres coitados esperando pelo tempo do, sempre bem-humorado, dentista. Algumas pessoas se viraram para ver quem entrava, pode ver nelas a mesma expressão chateada e enfadada, e enquanto era analisado, percebeu também o olhar triste de uma senhora de cabelos brancos. Ir àquele lugar sempre testa até onde chegam os delicados limites da paciência humana.

Olhou para direita procurando as cadeiras encostadas à parede, e foi então que a viu. Aliás, viu metade do seu rosto: pele muito branca, os cabelos castanho-escuros postos atrás da orelha com mechas soltas caindo sobre o lado visível da face, o nariz fino, os óculos pequenos com armação azulada, olhos fixos na página do livro, as pernas cruzadas, a saia florida à altura da coxa exibindo o belo joelho ligeiramente rosado... Sentar... Sentar! Havia esquecido. Ao lado dela, na interseção entre a parede lateral e a parede do fundo, isolada num canto, oculta, a santa cadeirinha verde.

Não iria ter ímpeto suficiente para interromper a leitura da moça, sabia disso. Queria apenas sentir a pulsação aumentar, precisava olhá-la melhor. Obrigou-se a fazer o mínimo para não se torturar depois, arrependendo-se, mais uma vez, do que deixou de fazer. Caminhou em direção à menina desviando das pernas de umas pessoas mais desleixadas e sem postura, passou na frente dela tomando um cuidado enorme para não tocar seu pé que balançava ritmado e sentou confiante ao seu lado. Ela não notou sua existência, ou talvez tenha notado, mas ele não percebeu: olhos imersos nas páginas do livro, expressão séria, pernas cruzadas sacudindo devagar o pé flutuante dentro da havaiana branca, e aquele ar típico de quem está completamente fora do mundo. Esse ar é meu, pensou ele. Sorriu baixinho.

Então, inclinou um pouco a cabeça para direita precavendo-se desnecessariamente para que ela não perceber-se, e pode admirar melhor seu rosto: queixo polido, boca grande, lábios finos, umas sardas na bochecha, sobrancelhas perfeitas, e olhos castanhos redondos incrustados no bendito livro. Virou rápido para frente tentando digerir a imagem da garota, e sentiu que as mãos começavam a suar. Sorriu de novo: sentiu-se pateticamente vulnerável a ela, e isso pareceu-lhe muito engraçado.

Veio então um súbito impulso impelindo-o a falar com a moça de qualquer maneira, mesmo que fosse para balbuciar alguma besteira, passar vergonha ou corar sem graça. Passou a perna direita por cima da esquerda num movimento brusco, baixou a cabeça e tentou ler algo do livro. No alto da página, em letras garrafais, conseguiu decifrar o que estava escrito: O DIA EM QUE URANO ENTROU EM ESCORPIÃO. "Morangos Mofados"... Morangos Mofados! Descuidado, quase pronunciou os pensamentos em voz alta. Conteve-se. Precisou olhar novamente o livro para acreditar. Ela realmente estava lendo Caio Fernando Abreu.

Ele é admirador obcecado de Caio F.:escritor que fala de amor e paixão com a mesma delicadeza, fluência e naturalidade que usava para encher os pulmões de oxigênio, para manter-se vivo. "Morangos Mofados" é a tradução em palavras de amontoados de coisas que não tem nome.

O rapaz ficou atônico, atordoado e pálido. É do tipo que acredita nos sortilégios irônicos do acaso e sua manifestação em coincidências totalmente inesperadas, mas aquela linda figura ao seu lado folheando as mesmas páginas em que ele lagrimou era demais para o seu ceticismo cego. Pigarreou.

Maldita chuva, maldito cabelo, maldita espinha, maldita idéia... Mais e mais sensações foram invadindo o moço: frio, pânico, euforia, medo, confusão... Junto delas, cresceu a vontade gritante de falar com a menina que o perturbava muda. Passou a encarar seu estado como um mal irremediável.

Precisa falar, tem que ser agora... Agora! Não, não, falar o quê? Não importa, deixa fluir, sabe como se faz... Calma, calma. Respira, abre a boca, vibra as cordas vocais, enrola a língua e mexe a boca. É fácil. Anda, anda... Fala do Caio, fala do Caio!

- Que horas são?

- Hã?

BURRO! Não fala mais nada!

Ele condenou-se sem dó enquanto o seu tênis vibrava sem parar expondo sua apreensão incontrolável.

- Nada.

- Desculpa, tava perdida no livro. Perguntaste as horas, não é?

- É, mas não se incomode. Tenho relógio. Foi só um pretexto besta pra falar contigo.

Mandei não falar mais nada!

Ela sorriu.

Ela sorriu?

- Olha, acho que não é a melhor forma de puxar papo. Eu te responderia a pergunta, tu provavelmente falarias ‘obrigado’, ficarias constrangido com o silêncio e eu voltaria à minha leitura achando que és um menino inseguro.

As palavras da garota atingiram-no como uma bala. Não que ele tivesse reprovado a reação dela, muito pelo contrário. Ela mostrou uma compreensão razoável a respeito dos meandros que permeiam um diálogo, e o mais importante: a capacidade de surpreendê-lo. Nosso amigo não é do tipo que se espanta com qualquer coisa, mas, a convicção e o conhecimento da moça ao seu lado eram sufocantes. A vulnerabilidade dele cresceu ao ponto de emudecê-lo por uns segundos.

Achou que estivesse numa espécie de transe: escutava as batidas do coração; enxergava uns olhos cintilantes que tentavam se encaixar nos olhos agitados dele; sentia um gelo no abdômen; um cheiro de foto velha; o gosto dela.

Ela sorria, despreocupada, exibindo ferros metálicos defendendo os dentes branquíssimos e bem formados, enquanto encarava-o divertindo-se com a cara espantada do rapaz que julgaria estar com ânsia de vômito se a situação fosse outra.

Olhos... Olhos, olhos... Nariz... Traços, sardas... Dentes, dentes... Lábios, boca, boca, lábios...

Ela via-o através de uma lupa.

Fala! Fala!

- Não sei o que dizer.

Não isso, cara...

- Não precisa dizer nada.

- Mas eu quero dizer algo, só que tô sem palavras... Triste ironia.

- Por que ironia?

Arriscou um sorriso cínico. Saiu totalmente sem jeito.

- Por nada. Gosto de usar palavras.

- Eu também.

- Como assim?

- Como tu.

- Como eu como assim?

A pergunta saiu afônica, ele falou apressado. Levará outro susto e a sua situação já era lamentável e digna de pena.

Ela riu de novo. Quase gargalhou: balançou o corpo, ajeitou os cabelos que caíram, descruzou as pernas, apertou os olhos, pressionou os lábios... Brilhava.

- Sou melhor que tu.

A menina falava num tom provocativo.

Cala a boca. Agora chega. Fica em silêncio e deixa que ela continue se quiser.

- Eu sei.

- Como?

- Não estás gaga.

Mais risos.

- Relaxa.

- Claro. Tens um calmante por aí?

IDIOTA.

- Minha cartelinha diária já acabou.

Sorriu aliviado.

Conversaram sobre calmantes, Caio, livros, escrever, medos, mentiras, pessoas e dentes por quarenta minutos. A recepcionista chamou-a, e então ele descobriu o nome da menina que agora é seu maior segredo. Depois de vinte minutos ela volta com um sorriso azul. Deu-lhe o número do celular, um beijo no rosto e uma carga elétrica que percorreu sem pressa cada osso da sua espinha dorsal. Logo depois foi a vez dele ser atendido.

Ficou repassando a conversa durante horas: enquanto o dentista trabalhava, no ônibus, no caminho para casa, no banho, antes de dormir, na aula, voltando para sua casa e, possivelmente, continuará a ouvir a voz firme da garota pronunciando palavras ferinas até ouvi-la outra vez, e outra, outra, outra... A imagem dela atormenta-o continuamente e lhe provoca a impressão de inchaço no peito. Ele ainda acha que se comportou como um completo idiota.

Finalmente percebi que o moço conseguiu o que tanto queria: qualquer coisa para gravar, um número para ligar, alguém em quem pensar, algo para temer, desconhecer o que esperar e uma excelente justificativa para libertar sua formidável loucura reprimida.

Quanto à garota, está feliz e apaixonada junto do seu formoso namorado. Ele sentiu um pouco de ciúmes ao escutá-la contar animada que encontrou uma pessoa super legal, apesar de um tanto estranha, no chato consultório odontológico. ''Muito provavelmente, será um bom amigo'', ela disse.







"...Ia continuar descrevendo a cena, pensou em acrescentar pinheiros, um crepúsculo, talvez um quarto crescente mourisco, quem sabe um lago até, quando a moça com o livro nas mãos tornou a baixar os óculos que erguera para a testa no momento em que o rapaz de camisa vermelha entrou, e leu um trecho assim:Os homens são tão necessariamente loucos que não ser louco seria uma outra forma de loucura. Necessariamente porque o dualismo existencial torna sua situação impossível, um dilema torturante. Louco porque tudo o que o homem faz em seu mundo simbólico é procurar negar e superar sua sorte grotesca. Literalmente entrega-se a um esquecimento cego através de jogos sociais, truques psicológicos, preocupações pessoais tão distantes da realidade de sua condição que são formas de loucura — loucura assumida, loucura compartilhada, loucura disfarçada e dignificada, mas de qualquer maneira loucura...’’

Morangos Mofados - O Dia Em que Urano Entrou Em Escorpião.
Caio Fernando Abreu.

domingo, 3 de agosto de 2008

Muito prazer.

Me desculpa, minha gente, mas eu realmente estou sem paciência e com nenhuma inspiração pra escrever coisinhas supimpas, singelas e bonitinhas. Sei que as pessoas que lêem meus textos esperam outra coisa, mas talvez seja... er... Curioso me conhecer melhor. Aliás, eu nunca agradeci às pessoas que freqüentam o blog e aquelas com um pingo de boa vontade que se sacrificam brutalmente e fazem um esforço sobre-humano pra deixar comentários quase sempre com elogios. Eu realmente acho a maioria deles muito exagerado, mas sei que são sinceros. Me estimulam muito (além de satisfazerem um pouquinho meu ego). Pode ser besteira, mas é importante pra mim. Muito, muito, muito obrigado de verdade.

Bom, a vontade de escrever me consome, e eu não vou esperar nenhum santo baixar em mim pra dizer o que eu quero dizer. Vou seguir o conselho do meu nobre amigo e dar um grito agudo.

Preciso de uma variante. É isso, eu preciso realmente de um rota alternativa. Um algarismo fora de lugar, o sinal trocado, o número complexo. Não que eu esteja insatisfeito com minha equação de merda, muito pelo contrário: as coisas estão bem encaminhadas e divertidérrimas. O problema é que eu não sou dado às mesmices. Essa dialética burra das ciências exatas repetindo resultados e limitando a visão a uma direção simples, mesmo quando parece um pouco mais complicada, é desestimulante. Não que eu compreenda tudo, longe de mim: sou o maior falso vidente do mundo, mas as coisas insistem em se repetir. Não é preciso olhar para o futuro para saber o que acontecerá, basta virar a cabeça para trás e dar uma olhada no passado.

Prazeres momentâneos são efêmeros e um tanto quanto autodestrutivos: desgastam fisicamente, emocionalmente e só não desgastam psicologicamente porque eu já aprendi a lidar comigo e com todas as minhas mudanças. Essa história de que a gente não é só um pode parecer papo de pseudo-escritor, mas é a maior constatação que podemos chegar depois de apanhar muito de todas as nossas faces. Elas ficam escondidas no meio das relações sociais, e algumas (as mais cretinas e danadas), aparecem quando estamos sós: e se tu não filosofar tu te ferra, porque acabas sem descobrir quem és. Isso é chato, porque é doloroso também: uma face batendo na outra. Pode parecer idiotice, mas elas batem muito forte, e sempre oferecem a que está ao lado pra levar outra safanada. Sei que parece coisa de gente que vai mal das idéias, mas tente abstrair um pouquinho, não tem como deixar de comentar isso. Mas aí depois de um tempo todas elas ficam dormentes, e tu ficas amortecido junto delas e não sente mais porra nenhuma: a pior parte é quando nem tu te alcança. É um vazio diferente, não é existencial, é sentimental.

‘’Socorro, não estou sentindo nada.’’ Por aí. Mas eu não acredito em ‘nada’, acho que nunca acreditei em ‘nada’. Palavrinha muito escrota: exclui tudo, e em ‘tudo’ eu também não acredito. O extremo é utopia, as coisas não são completas nem únicas: exceções quebram o sentido literal das palavras. Sobra a indiferença. Isso é pior que sofrer, cara. A indiferença te faz robô, e robôs são conjuntos de equações conseqüentes. Argh, eu realmente não gosto da lógica, sei que ela é importante, o homem não seria humano sem a lógica: não existiria agricultura, a ciência, a política, a filosofia, blá blá blá. Acho que pessoas burras são burras por falta de lógica, ou por falta de uma lógica acertada... Ou talvez seja só carência de fósforo mesmo (aprendi isso assistindo Chaves :). Cara, isso explica muita coisa sobre mim. A indiferença me faz escrever porcarias como essas também. Tenho que improvisar na falta de felicidade, desejo, paixão, tristeza e todas essas coisinhas meigas que te deixam em alfa. Sabe, isso é muito interessante mesmo, pense a respeito se não tiver nada melhor pra pensar (o que eu acho meio difícil).

Sou inconstante, volátil e melodramático, apesar de um pouco insensível. Insensível é a cereja do bolo. Sério, eu gosto, gosto mesmo. Dá pra analisar bem as coisas, não de forma lógica, da minha forma. Cada um tem a sua, a minha é meio burra e idiota, então não vou me dar ao trabalho de explicá-la. Sei que é mediocridade ter consciência da ignorância e não fazer coisa alguma a respeito, mas ainda não tive paciência pra rever esse meu conceito estúpido. Fato é que a minha parte insensível é muito pequena , é como um balão minúsculo que se encheu com as maravilhosas e mágicas inalterabilidades rotineiras (leia-se ‘meu saco’ [não o escrotal, pelomordedeuzu... Aliás, essa conotação é muito grosseira, não sei da onde tiraram... Poderia dissertar sobre isso, mas essa ponderação metafísica não é assunto pra um colchete dentro dum parêntese])

Não quero sair pelo mundo com R$1,47 na carteira, duas cuecas na mochila e um pacote de biscoito Bono (de morango) no bolso pra ter alguma emoção. Eu preciso é me apaixonar. Preciso mesmo (alguém se candidata? :D). Sei que os bilhares de leitores assíduos do blog que estão lendo isso agora e permanecem com os olhos lacrimejando colados na tela esperando ansiosos o desfecho desse desabafo belíssimo podem ter taquicardia ao ler as próximas palavras, mas eu preciso esclarecer isto. Pasmem, meu povo: nunca fui apaixonado. Nunquinha mesmo. Já me enganei algumas vezes sim, mas por pura necessidade e retardadice. Essa náusea provocada pela falta de sentimentos nos leva a auto-enganação. É muito cômodo fingir que se está entupido de amor, que a vida é multicolorida, que os pensamentos foram usurpados de forma atroz, que tu encontraste a perfeição encarnada em gente, que a existência e o universo fazem todo sentido, e poder jurar por deus que o conto das almas-gêmeas- siamesas-separadas-no-nascimento é verdade, e que a felicidade é maior que o tempo... Enfim, todos esses sintomas que vocês conhecem bem. Dá um barato legal tudo isso: supre carência, solidão, incompreensão, apatia, infelicidade, ego, além de fazer um bem enorme pro coração, previne problemas cardíacos e gastrointestinais.

Os sentimentos são relativos. Não dá pra definir com uma palavra o que cada um sente de forma única, as convenções são besteiras. ‘Amor’ e ‘paixão’ são apenas palavras como qualquer outras.
Use-as com moderação mesmo assim: o que a gente faz delas e o que entende por elas é o que importa.

Conselho de gente levemente neurótica a gente guarda no fundinho do coração, hein.

Beijo pra minha mãe, pra minha vó e pra minha irmã, amo vocês. E um viva à relatividade.

Huhul. (não, não tô bêbado. Eu tava anteontem, mas enfim.)